O VINHO NA COMIDA REGIONAL ITALIANA

5 de outubro de 2022 às 00:27

Na comida regional italiana é impossível desassociar o vinho da comida.Antes de tudo,ambos são comida,uma solida e outra liquida.

Na década de 70 estudava admintração de empresas na Eaesp/FGV em SP.O restaurante Ca’d’Oro sempre em alta e meus colegas abonados ,grande parte “oriundi” ,freqüentavam bastante este local,sua comida e vinhos.

E o cozido do restaurante era o carro chefe.Era o que no norte da Italia se chama de “bolitto” ,um prato barato mas trabalhoso de fazer,por exigir cozimento de carnes em tempos diferentes.Não há um padrão,há variações dependendo da região.No fundo ,um prato frugal,que foi alçado a alta gastronomia.

Economizei um pouco,tomei coragem e fui lá com meu grande amigo Sergio Romano,com pais da Calabria,que também namorava o prato( como morava sozinho em SP,era na casa dos pais dele que eu provava pratos regionais italianos;os de beringela eram divinos…).

O prato atendeu plenamente a nossa expectativa ,mas nosso orçamento na verdade não previa  o vinho.E ali,tanto pelo que vimos em todas as mesas já nesta remota década de 70 como pela brigada da casa,não existia comer sem beber um vinho .Eram inseparáveis e nós não estávamos tão convencidos financeiramente assim.

Olhamos a carta de vinhos e a coisa ficou mais dramática,pois tínhamos que prever os 10% .Sem cartão de credito para pendurar e depois resolver.

E olha que ali num canto da carta,sem destaque, achamos um Lambrusco italiano( um frizante) .Era disparadamente o mais barato.Cabia no bolso.Foi um belo jantar e um dos melhores a época.

A FGV ficava perto do bairro italiano Bixiga , para nós era o máximo que frequentávamos.

Ali perto da praça 14 Bis,nos fins de semana a gente batia também ponto no Posillipo,comida italiano barata e ótima .Nestas ocasiões os vinhos mais baratos eram as garrafas de chiantis revestidas de palha.Ficava numa rua decadente ,a Paim,perto de um grande predio,no fundo mesmo um  autentico treme-treme.Mas a comida era demais…Seu macarrão a Posillipo(com tomate,bacon e cebola) era dos deuses.Suas sopas,incríveis como a de queijo e de capeletti quatri formaggi.

O traseiro de cabrito com brócolis e batatas ,divino,mas mais caro,era só para ocasiões especiais.

Íamos muito com o seu Silva,português vindo da ilha Madeira,que morava em S.J.do Rio Preto e vinha visitar seu filho Luis Nivaldo que estudava comigo e era meu grande amigo,quase um irmão, hoje falecido.

Este restaurante foi um marco na minha vida no final dos anos 60 e toda a década de 70 como estudante.Depois voltei nele,no final dos anos 80,mas já não era a mesma coisa.Estava decadente.Perdeu-se nas falésias da Costa Amalfitana,de onde saiu seu nome,como li de alguem se referindo ao restaurante.

Lembrei-me acima da historia do cozido do Ca’d’Oro,o “bolitto” italiano porque perguntei recentemente ao grande amigo e sommellier Guilherme Correa,qual dos vinhos ele recomendaria para este cozido.Bingo.Ele indicou o top de linha Lambrusco Reggiano Concerto como harmonização espetacular!( Enoteca Decanter) . Provei.Os Lambruscos deste produtor são mesmo especiais.No geral,os frizantes italianos que hoje vem ao Brasil,sobretudo os muito baratos,tem qualidade duvidosa.

Vou pedir aos amigos chefs ( quem se atreve?) para revivermos o Ca’d’Oro neste prato e no vinho.Para os amantes de vinhos tranquilos,um belo Barbera do Piemonte (boas opções na loja De Marseille em Joinville) será também uma ótima pedida.Vale comparar.

Há poucos países onde o binômio vinho e comida está tão entrelaçado como na Italia.A harmonização se dá menos pela estrutura e mais pela cultura centenária dos pratos e vinhos regionais.

Da próxima vez que você for cozinhar,pense nas inúmeras combinações regionais italianas em vinho e comida,saindo dos onipresentes risotos e lasanhas,passando por seus inúmeros vinhos regionais e não difundidos muito ainda.

Salute!

Aldo Cadorin, sommelier pela ABS-PR/Brasil,FISAR/Italia e WSET/level 2.